quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Escrito. Não digo.

- O que está escrevendo?
- Nada.
- Como "nada" se as palavras estão aí?!
- Estão aí porque você disse e eu tive que falar.
- Mas eu não disse.
- Como não?! Você começou o diálogo com uma pergunta e eu respondi.
- Exato.
- Então pronto.
- Mas eu não falei nada.
- Por que discorda?
- Porque eu não falei, eu escrevi.
- Como assim?
- Você está ouvindo alguma coisa que eu falo? Aposto que o leitor desse blog também não está ouvindo nada.
- Como você pode ter certeza? Acho melhor perguntar para algum leitor.
- Também acho... com licença, leitor, você está ouvindo alguma coisa aí? Consegue ouvir a minha voz?
- Não.
- Mas você não é leitor!
- Claro que sou! Você disse agora pouco que eu não estava ouvindo a sua voz, então eu só posso estar lendo.
- Eu não disse nada. Eu escrevi.
- De acordo.
- Pois bem. Podemos concluir que estamos escrevendo e não falando.
- Quem disse?
- Eu disse!
- Mas você está escrevendo e não falando, como pode dizer alguma coisa?
- Foi apenas força do hábito. Quis dizer, ou melhor, quis escrever que escrevemos e não falamos.
- Como pode ter tanta certeza?
- Porque eu perguntei para o leitor se ele nos ouvia.
- E se ele for surdo? Poderíamos estar falando e, assim, ele não nos ouviria.
- Escuta, o leitor que respondeu a minha pergunta era você.
- Mas eu não posso.
- Não pode o quê?
- Não posso escutar.
- E por acaso você é surdo?!
- Não, sou leitor.
- Acho que aqui são a mesma coisa.
- Um surdo e um leitor?
- Sim, pelo menos de certa forma. Afinal nenhum ouviria a nossa conversa.
- Mas pensei que estávamos escrevendo.
- Acho que nem isso.
- E como conversamos?
- Alguém escreve por nós.
- Não é possível! Ninguém pode escrever exatamente aquilo que eu quero dizer.
- Mas aqui nós escrevemos e não dizemos.
- Enfim! Ninguém pode se expressar por mim.
- Pode sim.
- Quem?
- Aquele que te pôs nesse mundo.
- Pai?
- Não. O autor.
- E esse autor se expressa por mim? Igualzinho como eu me expressaria por mim mesmo?
- Pelo visto sim. Você foi sincero até agora?
- Acredito que sim.
- Bom menino.
- Como sabe?
- Como sei o quê?
- Que sou menino.
- Não sei. Deduzi eu acho.
- Só porque afirmei que era leitor?
- Não entendi.
- Eu poderia ser uma leitora.
- É verdade. Mas você escreveu que era leitor. Confio na sua sinceridade.
- Eu também, mas não confio na sinceridade do autor. E ele está se expressando por mim.
- Poderia ser pior.
- Como?
- Ele poderia não estar se expressando. Nós não existiríamos.
- E por acaso, em algum momento, nós já existimos?
- Para ele sim.
- É... se para ele e por ele temos vida, podemos continuar assim.
- Com certeza. Enquanto ele tiver palavras, viveremos.
- Quer dizer que eu sou feito de palavras?
- Ah... não estraga o final bonito.
- Que final?

4 comentários:

Alessandra Castro disse...

Oi eu sou loira e acho q entendi alguma coisa.

Hummmm...

Só sei q me acabei de rir com o leitor surdo. ;)

Tchelo disse...

huahauah
é...
pensando assim... isso não é um comentário... não meu... pq vc nao ta me ouvindo nem me vendo.. vc ta lendo ai, mas vc pode estar sendo enganado... nao pelo Tchelo pq ele nao te enganaria pq ele te ama... mas por mim... mua-ha-ha.

Que doidera, velho..! =D

Mar e Ana disse...

uou :O
Pensar sobre isso dá nós.
Mas é legal
ahuahuahuahuahauha

Leitor surdo e personagem, autor, narrador, eu-lírico q enganam
hauahuha
vai saber?

:*****

Vitor disse...

E eu que sou leitor e autor? Como fico? Surdo? =/